Do que se trata o artigo:

Neste artigo serão apresentadas as principais características das redes IP multicast. Estas suportam as comunicações multiponto, demandadas pelas novas aplicações da Internet, tais como: IPTV, videoconferência, ensino a distância, entre outras. Para tanto, serão abordados os protocolos de gerenciamento de grupos de usuários e os algoritmos de roteamento utilizados para o encaminhamento dos pacotes IP multicast.


Em que situação o tema é útil:

Os tópicos abordados serão fundamentais para a compreensão dos conceitos básicos relativos à manutenção e à operação das redes IP multicast. Estas possuem características distintas das transmissões unicast, comumente observadas em aplicações de correio eletrônico e navegação na web. Portanto, podem servir tanto para o embasamento teórico visando à implantação deste recurso nas redes das organizações, quanto à análise e avalição do funcionamento de serviços já em produção.

Resumo DevMan:

O suporte ao recurso de comunicação multiponto está se tornando cada vez mais comum nas redes de dados modernas, especialmente porque este tipo de transmissão faz o melhor uso de seus recursos e reduz o consumo de banda nos enlaces entre os segmentos de rede. Entretanto, a implementação e a manutenção deste serviço requer conhecimentos específicos de sua arquitetura de operação, que envolve protocolos de gerenciamento de grupos usuários e de roteamento de pacotes multicast. Além disso, são fundamentais os conceitos sobre a hierarquização e a alocação dos endereços IP, possibilitando o desenvolvimento de projetos segundo as diversas recomendações e normalizações existentes.

O serviço IP multicast pode ser caracterizado como um conjunto de protocolos e mecanismos que tornam possível o envio de mensagens simultâneas para um grupo de usuários em uma rede de dados IP. Esse serviço tem sido requisitado pelas aplicações multimídia emergentes da Internet, viabilizadas principalmente pelo aumento da disponibilidade de redes com alta capacidade e alto desempenho. Entre outras vantagens da comunicação multiponto, destaca-se o melhor uso dos recursos da rede, pois os fluxos de dados são otimizados, sobretudo quando comparados à transmissão ponto-a-ponto (unicast).

Neste artigo, serão detalhadas a alocação dos endereços IP, sua organização em classes distintas e o subconjunto reservado às redes multicast. Também será relatada a arquitetura genérica deste serviço, contextualizada em duas partes com funções distintas. A primeira parte tratará do gerenciamento de grupos de usuários, com a apresentação dos protocolos responsáveis pelas ações relacionadas à composição dos grupos, tais como: a manipulação de informações dos participantes, a inclusão e a exclusão de seus usuários. Já a segunda parte, descreverá a infraestrutura de distribuição de pacotes, na qual serão expostos os protocolos de roteamento IP multicast, que coordenam os recursos de processamento e comunicação; são esses protocolos que tornam possível o encaminhamento de mensagens entre os servidores e os consumidores do conteúdo multicast.

Introdução ao IP multicast

As redes surgiram a partir da necessidade da troca de dados entre pessoas e computadores, possibilitando o acesso a documentos, imagens, planilhas, arquivos de áudio e vídeo, entre outros. Em setembro de 1981 foi publicada a especificação do protocolo IPv4 (Internet Protocol version 4), doravante designado simplesmente IP. Desde o início, esse protocolo se caracterizou pela simplicidade de implantação, interoperabilidade e robustez, sendo atualmente o padrão adotado nas comunicações pela Internet.

Nas redes IP, cada dispositivo conectado (desktops, notebooks, celulares, servidores etc.) utiliza um identificador denominado endereço IP. Composto por 32 bits (4 octetos), cada byte usualmente é representado na forma decimal (0 a 255), separado por pontos, embora também possa ser adotada a notação binária, conforme ilustrado na Figura 1.

Figura 1. Possíveis representações de um endereço IP.

Inicialmente, o conjunto total de endereços IP (pouco mais de 4 bilhões) foi agrupado em cinco categorias distintas, com a finalidade de atender às necessidades das redes de computadores com diferentes tamanhos (Tabela 1). Destarte, endereços de classe A foram utilizados por grandes empresas, com até 16,7 milhões de dispositivos; já aquelas com até 65 mil, empregaram endereços de classe B. A classe C atendeu pequenas organizações, com cerca de 250 equipamentos. Por fim, os endereços de classe D e E foram reservados, respectivamente, para aplicações multicast e pesquisas.

Categoria

Endereço inicial

Endereço final

Número total de dispositivos endereçáveis

Classe A

1.0.0.0

126.255.255.255

16.777.214

Classe B

128.0.0.0

191.255.255.255

65.534

Classe C

192.0.0.0

223.255.255.255

254

Classe D

224.0.0.0

239.255.255.255

Reservado para multicast

Classe E

240.0.0.0

255.255.255.255

Uso experimental

Tabela 1. Categorias dos endereços IP.

Diferentes formas de comunicação podem ser adotadas para a transmissão dos pacotes IP (denominação atribuída aos dados encaminhados por intermédio das redes de computadores). Em cada uma delas, classes específicas de endereçamento podem ser aplicadas:

· Broadcast: nesta forma de comunicação, os dados são encaminhados para todos os dispositivos. Por convenção, o último endereço IP de cada rede é designado endereço de broadcast (seja da classe A, B ou C). No exemplo ilustrado na Figura 2, ao remeter um pacote para 10.0.0.255, a estação A enviará uma cópia deste aos dispositivos conectados à rede (10.0.0.11, 10.0.0.12, 10.0.0.13, 10.0.0.14 e 10.0.0.15), sem a necessidade de identificá-los individualmente;

Figura 2. Comunicação broadcast (difusão) entre dispositivos conectados à rede.

· Unicast: é uma transmissão ponto-a-ponto, ou seja, de um emissor a um destinatário, por meio de seu endereço de classe A, B ou C. No exemplo a seguir (Figura 3), o dispositivo A envia um pacote diretamente para B, através de seu endereço IP 10.0.0.11.

Figura 3. Comunicação unicast (ponto-a-ponto) entre dispositivos conectados à rede.

· Multicast: neste método, os pacotes são enviados para um grupo de dispositivos (multiponto) identificado por um endereço IP da classe D. Deste modo, caso os usuários B e F desejem receber as mensagens de A, estes devem demonstrar seu interesse a fim de que o emissor as encaminhe (Figura 4). É importante observar que a principal diferença entre um pacote multicast e os demais, é a presença do endereço IP de classe D (designação do grupo), ao invés de um da classe A, B ou C.

Figura 4. Comunicação multicast (multiponto) entre dispositivos conectados à rede.

Atualmente, diversas aplicações emergentes da Internet, como o IPTV (Internet Protocol Television – tecnologia de transmissão dos sinais televisivos para aparelhos digitais por intermédio do protocolo IP), ensino a distância, videoconferência e computação distribuída, necessitam de suporte à comunicação multiponto. Essas aplicações se diferenciam do tradicional envio de mensagens de correio eletrônico ou mesmo da navegação em páginas na WWW (World Wide Web), pois podem ter mais de um emissor do conteúdo, além de diversos receptores, podendo chegar a alguns milhões, no caso da IPTV. Conforme será apresentado nas seções a seguir, o IP multicast suporta essas novas aplicações por intermédio do gerenciamento dos grupos de usuários e da implementação de protocolos de roteamento de pacotes multicast – responsáveis pela determinação do melhor caminho entre dois ou mais dispositivos (Figura 5).

Figura 5. Serviços implementados pelo IP Multicast.

Características gerais

Segundo Luís Henrique M. K. Costa e Otto Carlos M. Bandeira Duarte, em seu artigo Roteamento multicast na Internet, o modelo de serviço IP multicast especifica um grupo como uma comunicação aberta, onde:

· qualquer dispositivo conectado à rede pode participar, sem a necessidade de autorização do remetente;

· não há limitação quanto ao número de grupos aos quais um usuário pertença, ou seja, este pode receber o conteúdo de um ou mais grupos simultaneamente;

· não há obrigatoriedade do originador de tráfego fazer parte do grupo;

· os dispositivos podem entrar ou sair a qualquer instante, portanto o grupo caracteriza-se por sua natureza dinâmica;

· os participantes não são conhecidos, nem pelo remetente, nem pelos demais receptores.

Os grupos multicast são identificados por intermédio de um endereço IP da classe D, entre 224.0.0.0 e 239.255.255.255. A partir dessa identificação, o IANA (Internet Assigned Number Authority), órgão internacional responsável pela alocação de endereços IP na Internet, determinou propósitos especiais para partes deste conjunto. A lista a seguir destaca as principais faixas reservadas:

· 224.0.0.0 a 224.0.0.255: corresponde aos endereços que não são encaminhados pelos roteadores a outras sub-redes, ficando restritos à rede local. São utilizados para compartilhamento de mensagens de controle por diversos protocolos. A Tabela 2 ilustra alguns exemplos;

Endereço

Descrição

224.0.0.1

Todos os dispositivos na rede.

224.0.0.2

Todos os roteadores na rede.

224.0.0.9

Utilizado pelo protocolo de roteamento dinâmico RIPv2 (Routing Information Protocol version 2) para a atualização das tabelas de rotas.

224.0.0.13

Utilizado pelo protocolo de roteamento multicast PIM (Protocol Independent Multicast) para o compartilhamento de informações da topologia.

224.0.0.18

Utilizado pelo protocolo de redundância de VRRP (Virtual Router Redundancy Protocol) para prover a redundância entre roteadores em uma mesma rede local.

224.0.0.102

Utilizado pelo protocolo de redundância de HSRP (Hot Standby Router Protocol), proprietário da Cisco Systems, para prover a redundância entre roteadores em uma mesma rede local.

Tabela 2. Exemplos de endereços reservados na faixa 224.0.0.0 a 224.0.0.255.

· 233.0.0.0 a 233.255.255.255: faixa reservada à atribuição automática de endereços aos sistemas autônomos (SA). Um SA é uma coleção de blocos de endereços IP e equipamentos de rede sob o controle de uma mesma organização, a qual é identificada por um número inteiro com 16 bits (0 a 65535). O método para determinação dos endereços é conhecido como GLOP (curiosamente esta sigla não é um acrônimo, mas a própria designação da técnica) e tem como mecanismo básico a inclusão do número do sistema autônomo no endereço multicast. O exemplo ilustrado na Figura 6 pressupõe uma empresa com SA 5662. Considerando que este número também pode ser representado em notação binária com 16 bits, basta convertê-lo e associá-lo ao segundo e terceiro octetos do endereço multicast. Assim, a empresa com SA 5662 poderá usar a faixa de endereços 233.22.30.0 a 233.22.30.255;

Figura 6. Faixa de endereçamento multicast baseado no número do sistema autônomo de uma organização.

· 239.0.0.0 a 239.255.255.255: conjunto de endereços alocado para configuração local nas organizações, não encaminhado à Internet (privado).

Os demais endereços podem ser atribuídos dinamicamente pelas aplicações. Desta forma, como não existe um controle similar àquele feito aos endereços IP unicast, há o risco de diversos remetentes de tráfego multicast elegerem um mesmo endereço de grupo, ou seja, os clientes podem receber mensagens de outras aplicações, gerando inconsistências e informações corrompidas.

Visando o controle do escopo dos pacotes multicast, as aplicações frequentemente utilizam o campo TTL (Time To Live) do cabeçalho IP. Este foi criado com o intuito de evitar que, principalmente em decorrência de problemas de roteamento, um pacote fosse transmitido indefinidamente pela rede. Portanto, o valor do TTL é decrementado em uma unidade, em cada roteador pelo qual o pacote atravessa, sendo descartado ao atingir o valor zero. Dependendo do valor definido aos pacotes multicast, estes podem ter escopo restrito à rede local, ao site da organização, à região, entre outros (Figura 7).

Figura 7. Restrição de escopo dos pacotes IP multicast segundo o TTL configurado.

Os servidores de pacotes multicast devem atribuir o valor do TTL conforme a localização dos clientes. Entretanto, com o intuito de assegurar o escopo da transmissão, especialmente nos casos em que não é possível definir o número de roteadores entre o emissor e o receptor, é possível definir um valor limite (threshold) para o encaminhamento do tráfego multicast, nos roteadores que delimitam a rede da organização. Estes dispositivos, além de decrementar o valor do TTL, descartam o pacote quando o valor obtido for inferior ao threshold, garantindo que o mesmo não seja propagado para outras redes (Figura 8).

Figura 8. Controle do escopo utilizando o TTL threshold nos roteadores que delimitam a rede de uma organização.

Segundo Chuck Semeria e Tom Maufer, em seu artigo Introduction to IP Multicast Routing, o IANA também reservou uma faixa de endereços MAC (Media Access Control) para o serviço IP multicast com o objetivo de aperfeiçoar a transmissão dos pacotes nas redes locais, quando empregada a tecnologia Ethernet (visto que esta igualmente possui suporte às comunicações ponto-a-ponto, broadcast e multicast). O MAC é um endereço físico com 48 bits utilizado na identificação das interfaces de conexão às redes de computadores. Para tanto, foi desenvolvido um procedimento com a finalidade de mapear os endereços IP da classe D para endereços MAC: este consiste basicamente na justaposição entre um prefixo de 25 bits e os 23 bits menos significativos do endereço IP multicast. Desta maneira, anexa-se o valor 00000001-00000000-01011110-0 (01-00-5e, em representação hexadecimal) aos 23 bits finais (contados a partir da direita para esquerda) do endereço IP, conforme ilustrado na Figura 9.

Figura 9. Mapeamento entre endereços de classe D e MAC.

É importante notar que, caso estejam em uso endereços IP da classe D que se diferenciam apenas pelos bits mais significativos, estes resultarão em MAC duplicados. Nestas ocorrências, os clientes do tráfego multicast precisam ratificar se o endereço IP pertence ao grupo correto; caso contrário, devem descartar o pacote recebido.

Vantagens e desvantagens da trasmissão IP multicast

Entre as principais vantagens da comunicação multicast, está o menor consumo de banda entre o servidor e os clientes. Suponha o cenário descrito na Figura 10, no qual um servidor de IPTV está atendendo os clientes A, B, C, D e E, por intermédio de fluxos unicast com aproximadamente 1 Mbps de largura de banda. Neste cenário, o enlace entre o servidor e o roteador R1 deve suportar ao menos 5 Mbps (somatória dos fluxos); já a conexão entre R1 e R2 consumirá 3 Mbps e, por fim, os enlaces entre R2 e R4, e entre R1 e R3, cerca de 2 Mbps (cada um). Observe que os roteadores R1, R2, R3 e R4 precisam encaminhar múltiplos fluxos de dados exatamente iguais. Imagine agora uma rede com centenas de milhares de usuários recebendo a mesma transmissão de um programa através da IPTV. Qual seria a largura de banda necessária entre os servidores de conteúdo e seus roteadores de acesso à Internet?

Figura 10. Fluxos unicast entre um servidor de IPTV e seus usuários.

A Figura 11 ilustra o mesmo cenário anterior, porém usando a infraestrutura de IP multicast para as transmissões multipontos. Por meio do gerenciamento de grupos e do roteamento multicast, é possível que, independentemente do número de usuários interessados no conteúdo, um único fluxo atravesse a rede. Desta maneira, será utilizado cerca de 1 Mbps (neste exemplo) em todos os enlaces de comunicação.

Figura 11. Fluxos multicast entre um servidor de IPTV e seus usuários.

Além da redução do tráfego e do uso eficiente da largura de banda da rede, destacam-se as seguintes vantagens do serviço IP multicast:

· Os servidores e os clientes suportam a configuração desta funcionalidade sem a necessidade da aquisição de novos softwares, pois todos os sistemas operacionais atuais disponibilizam este recurso;

· Não são necessários investimentos na infraestrutura da rede, já que os equipamentos modernos possibilitam o encaminhamento de pacotes multicast e a implantação dos protocolos de roteamento;

· Redução do processamento nos dispositivos de rede (desktops, servidores, roteadores, entre outros), resultante da redução do número de pacotes propagados pela rede.

Por fim, a lista a seguir apresenta os principais pontos negativos do IP multicast:

· O remetente não conhece a identidade e sequer o número de clientes que estão recebendo o conteúdo;

· Atacantes podem explorar facilmente a segurança de redes com este recurso, pois a associação e a desassociação dos usuários no grupo ocorre de maneira anônima;

· A necessidade de treinamento e capacitação dos profissionais que suportam a infraestrutura de IP multicast, pois envolve conceitos e protocolos diferentes daqueles habitualmente conhecidos, principalmente por aqueles que trabalham exclusivamente com a comunicação unicast.

Gerenciamento de grupos de usuários

O Internet Group Management Protocol (IGMP) é responsável por informar aos roteadores de um segmento de rede local sobre a presença de usuários interessados em participar de um grupo, gerenciando sua inclusão e exclusão. Uma analogia pode ser feita com a função do controle remoto em um aparelho televisor, o qual permite ligar ou desligar a recepção dos sinais de um determinado canal (similaridade com a participação em um grupo multicast).

Sendo assim, suponha uma aplicação que deseja se registrar em certo grupo, doravante denominado G; para tanto, esta deve enviar uma mensagem IGMP Join para a rede local, notificando sobre seu interesse em receber os pacotes destinados a G. Caso existam múltiplos roteadores neste segmento, o protocolo IGMP elegerá um deles, que será denominado Designated Router (DR) e terá a função exclusiva de processar todas as mensagens multicast trocadas pelos dispositivos (Figura 12). Daniel Barroso Monteiro, no artigo Protocolos de Roteamento Multicast, destaca que o DR encaminha apenas uma cópia do pacote na rede local. Desta forma, todos os solicitantes devem monitorá-la por intermédio do endereço MAC do grupo G.

Figura 12. Mensagem de inclusão do participante no grupo G.

Periodicamente, os roteadores também enviam mensagens IGMP Membership Query, inquirindo os dispositivos conectados à rede sobre o interesse em participar de algum grupo. Ao recebê-las, os usuários respondem em quais grupos desejam participar, por intermédio do IGMP Membership Report. Veja a Figura 13.

Figura 13. Mensagens enviadas para confirmar o interesse no conteúdo do grupo G.

Existem três especificações diferentes do IGMP, a saber:

· IGMP v1: proposta inicial do protocolo, publicada em agosto de 1989;

· IGMP v2: nesta segunda versão, disponibilizada em novembro de 1997, a principal mudança foi a implementação de um mecanismo de exclusão do grupo, onde os clientes podem notificar explicitamente o remetente, avisando que não desejam mais receber os pacotes;

· IGMP v3: a alteração mais significativa nesta variante, anunciada em outubro de 2002, foi a inclusão do suporte à filtragem do tráfego, possibilitando ao solicitante determinar quais remetentes terão seus pacotes aceitos.

Portanto, no IGMP v1, o tráfego multicast é enviado até que o registro do grupo G expire (timeout). Somente quando o roteador não receber resposta às suas mensagens IGMP Membership Query, para um grupo G, este poderá excluí-lo de sua tabela de roteamento.

Já no IGMP v2, devido ao suporte à mensagem IGMP Leave, o receptor do conteúdo pode notificar ao remetente seu interesse em abandonar o grupo G, possibilitando ao roteador removê-lo imediatamente. Caso não existam outros dispositivos interessados, o grupo também poderá ser retirado. Neste caso, o roteador envia uma mensagem denominada IGMP Membership Group-Specific Query, para o grupo G. Se não houver resposta, o grupo será excluído (Figura 14).

Figura 14. Mensagens para exclusão explícita do grupo (IGMP v2).

A versão mais recente do protocolo IGMP (v3) suporta a filtragem dos remetentes. Consequentemente, as aplicações usuárias podem determinar quais os emissores terão seus pacotes aceitos (por exemplo, servidor A e B), ou quais serão bloqueados (exceto os servidores C e F, todos os demais podem enviar). Desta maneira, os roteadores podem identificar quais pacotes não precisam ser encaminhados, por não serem aceitos pelos destinatários, mesmo que pertençam ao grupo.

Independentemente da versão, o protocolo IGMP trata a comunicação entre os clientes e o roteador no segmento local de rede. Para que o conteúdo gerado pelos remetentes seja encaminhado aos solicitantes, é necessária a criação de uma árvore de distribuição, através dos protocolos de roteamento multicast, conforme será exposto na próxima seção.

Protocolos de roteamento multicast

Segundo Daniel Barroso Monteiro, em seu artigo Protocolos de Roteamento Multicast, o primeiro protocolo de roteamento multicast desenvolvido foi o Distance Vector Multicasting Routing Protocol (DVMRP). Este emprega o algoritmo vetor de distâncias, no qual os roteadores possuem uma tabela que armazena as menores distâncias para os destinos conhecidos e por onde os pacotes devem ser enviados, a fim de determinar as rotas a cada originador de tráfego multicast. Destarte, quando um roteador com suporte a DVMRP recebe mensagens de algum remetente, este inicialmente verifica se os dados chegaram pela mesma interface que seria utilizada para propagar pacotes a esta origem. Em caso afirmativo, os pacotes são encaminhados a todas as interfaces de saída, inundando os segmentos diretamente conectados. Outros roteadores ligados a estas redes poderão solicitar o cancelamento do envio dos pacotes multicast, se não possuírem usuários participando do grupo.

Devido a estas características de operação, o protocolo DVMRP é denominado dense-mode, uma filosofia que pressupõe a existência de muitos transmissores e receptores na rede, transmitindo os fluxos em todos os enlaces da comunicação. Portanto, é necessário que os roteadores que não possuam interesse nos pacotes de algum grupo notifiquem explicitamente os dispositivos que estão propagando tais mensagens.

Outra opção é o Multicast Open Shortest Path First (MOSPF), expansão do Open Shortest Path First (OSPF), protocolo de roteamento de pacotes unicast extensivamente utilizado. O MOSPF encaminha as mensagens IP multicast de um emissor para as aplicações solicitantes por meio de uma árvore, que apresenta como raiz o roteador que as recebeu, e galhos que terminam em clientes participantes do grupo. Este protocolo emprega o IGMP para determinar a localização dos usuários interessados nas mensagens multicast.

Comparado ao DVMRP, o MOSPF é mais estável, porquanto utiliza o algoritmo global estado de enlaces (onde a topologia completa da rede é conhecida por todos os roteadores), que converge rapidamente e não apresenta problemas mesmo quando ocorrem mudanças em redes complexas e redundantes. Por outro lado, sua principal desvantagem é a dependência da utilização do OSPF como protocolo de roteamento unicast.

O Protocol Independent Multicast (PIM) se mostra como uma alternativa aos protocolos DVMRP e MOSPF, que pode ser implementada segundo duas variantes: o PIM-DM (Dense-Mode) e o PIM-SM (Sparse-Mode). A primeira, com operação similar ao DVMRP, ou seja, realiza a inundação periódica, propagando os pacotes multicast para todos os dispositivos conectados à rede. Já o PIM-SM é um dos protocolos de roteamento multicast mais usados em grandes e complexas redes, pois assume que a distribuição dos receptores é esparsa. A denominação PIM decorre do fato da propagação dos pacotes multicast não depender de nenhum protocolo de roteamento unicast específico, sendo sua implantação simplificada em redes que estão em produção, pois suporta as configurações prévias existentes.

O PIM-SM foi proposto para cenários em que o número de clientes multicast é pequeno ou quando estes estão espalhados na rede. Esse protocolo somente é suportado pelos roteadores da infraestrutura, ou seja, os emissores e receptores de conteúdo multicast não devem implementá-lo. Periodicamente, os roteadores configurados como PIM-SM enviam mensagens PIM-SM Hello para identificar e manter as sessões ativas com seus vizinhos (Figura 15). Caso um roteador deseje receber os pacotes de certo grupo (G), este deve enviar mensagens PIM-SM Join (similar ao IGMP Join, porém entre os roteadores), conforme ilustrado na Figura 16.

Figura 15. Identificação e manutenção de sessões ativas com roteadores vizinhos.

Figura 16. Envio de mensagem para participação em certo grupo.

O PIM-SM utiliza árvores de encaminhamento para cada grupo. Com isso, um dos roteadores passa a ser denominado Rendezvous Point – RP (ponto de encontro), possuindo a função de reunir os servidores de conteúdo e os clientes consumidores destas mensagens. Neste cenário, todos os pacotes multicast recebidos pelos roteadores da infraestrutura, que sejam originados pelos servidores, deverão ser encaminhados ao RP. Analogamente, os pedidos de participação em grupos gerados pelos clientes também são enviados ao mesmo roteador (Figura 17). Desta forma, são estabelecidas as Rendezvous Point Trees (RPT), as quais podem ser reconfiguradas como Shortest Path Trees (SPT) após a propagação do fluxo inicial de pacotes. Estas últimas são caminhos multicast otimizados com base nas informações do protocolo de roteamento unicast suportado, viabilizando a comunicação direta entre os emissores e os receptores de conteúdo (Figura 18).

Figura 17. Encontro de servidores e consumidores de conteúdo multicast no RP.

Figura 18. Otimização do caminho multicast por meio da SPT.

Os protocolos apresentados anteriormente (DVMRP, MOSPF e PIM) são empregados com o intuito de permitir a comunicação entre dispositivos de uma mesma organização (sistema autônomo). A implantação da funcionalidade IP multicast entre empresas, por intermédio da Internet é muito complexa, pois transcende as questões técnicas, envolvendo políticas e estratégias que não são objeto de análise neste artigo.

Conclusões

A demanda pelo suporte ao serviço IP multicast está crescendo, principalmente pelo célere desenvolvimento das aplicações multimídia, como IPTV, videoconferência, ensino a distância, computação distribuída, entre outras. Dentre suas principais vantagens, está a redução no uso dos recursos da rede, bem como o menor consumo de largura de banda nos enlaces que conectam os originadores e os usuários consumidores deste conteúdo. Além disso, geralmente não são necessários investimentos na infraestrutura da rede de dados e no software de servidores e clientes, pois esta é uma tecnologia suportada pelos equipamentos e sistemas operacionais atuais. Por outro lado, existem sérias limitações relacionadas aos aspectos de segurança da informação e à capacitação técnica dos profissionais da área, pois esta envolve conceitos e protocolos diferenciados daqueles frequentemente empregados nas transmissões unicast.

A arquitetura das redes IP multicast comumente é descrita em duas partes com funções específicas. A primeira está relacionada ao gerenciamento (inclusão e exclusão) dos participantes nos grupos multicast, e é mantida pelo protocolo Internet Group Management Protocol, que possui três versões distintas. Já a segunda parte refere-se à infraestrutura da rede necessária à propagação dos pacotes IP multicast. Neste contexto, os protocolos Distance Vector Multicasting Routing e Protocol Independent Multicast – Dense-Mode não são aplicáveis às grandes redes, pois suas filosofias pressupõem a transmissão inicial dos fluxos de pacotes multicast em todos os enlaces de comunicação, gerando tráfegos de dados muitas vezes desnecessários. O Multicast Open Shortest Path First, embora se destaque pela estabilidade, possui dependência do Open Shortest Path First, inviabilizando sua configuração em redes que empregam outros protocolos. Por fim, o Protocol Independent Multicast – Sparse-Mode se apresenta como uma alternativa extensivamente utilizada, especialmente em grandes e complexas redes, pois pode ser habilitado conjuntamente com qualquer protocolo unicast. Além disso, possibilita a otimização dos fluxos de pacotes multicast, enviando-os somente aos clientes que explicitamente notificaram o interesse em recebê-los.

Links

Artigo “Introduction to IP Multicast Routing”, escrito por Chuck Semeria e Tom Maufer.
http://www.stanford.edu/class/ee384a/files/Introduction_to_IP_Multicast_Routing.pdf.

Artigo “Protocolos de Roteamento Multicast”, escrito por Daniel Barroso Monteiro.
http://www.midiacom.uff.br/~debora/fsmm/trab-2007-1/multicast.pdf.

Artigo “Roteamento multicast na Internet”, escrito por Luís Henrique M. K. Costa e Otto Carlos M. Bandeira Duarte.
http://gta.ufrj.br/ftp/gta/TechReports/CoDu03.pdf.