Creio que todos que estivemos no Just Java 2005, o maior evento sobre Java do país (em 2005), podemos comemorar o grande mercado que esta tecnologia já alcançou no Brasil. É uma grande vitória da flexibilidade, portabilidade e padronização sobre os modelos mais restritos de softwares. No entanto, foi impossível não sair decepcionado ao constatar o nível de imaturidade que ainda permeia muitos discursos sobre a vertente Open-Source do Java (especialmente o J2EE Open-Source) no Brasil.

Em nosso stand, recebemos visitas de diretores, gerentes e alguns desenvolvedores Java que, mesmo após terem assistido a mais de uma palestra sobre "Open-Source" (modelo ou tecnologias), saíram mais convencidos de que comprar Oracle, IBM ou SUN era sua melhor opção!?... Como assim? Como isso é possível em 2005, apesar dos últimos anos de estrondoso sucesso do J2EE Open-Source em todo o mundo?

Após três ou quatro explanações para estas pessoas (e, vejamos bem, congressistas no Just Java!) sobre "Managed Open-Source", "Open-Source 2.0" ou "Professional Open-Source", entendi o motivo do receio: eles simplesmente ignoravam os fatos e evoluções mais recentes acerca deste movimento. Desconheciam o histórico de problemas já identificados em fases incipientes, e desconheciam os formatos mais atuais de gerenciamento e licenciamento nesta linha, que estão viabilizando a saída do Open-Source das adjacências para as aplicações de missão crítica das grandes empresas!

Como, após tais explicações, todos deles passaram a considerar o J2EE Open-Source com mais seriedade (finalmente), achei que este manifesto seria de valia para nossa comunidade, nosso país e, principalmente, para as empresas consumidoras de TI (sim, as instituições em primeiro plano, que afinal são a "mola" de nosso progresso!).

Histórico de Evolução do Movimento Open-Source Em um dos mais sérios estudos (incluindo pesquisa de mercado) já elaborados sobre OSS (Open-Source Software), realizado em Março de 2004 pelo Delphi Group, este instituto organiza a história deste movimento em três fases. Para facilitar a quem não tem tanto tempo, segue um resumo analítico:

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Open-Source 1.0 (Software Gratuito e Aberto)

Esta fase se iniciou com movimentos de "hackers" do fim da década de 70 e seguiu pela instituição bem sucedida do GNU Project e da Free Software Foundation, com representantes iniciais de sucesso como o Apache, Linux, MySQL. Finalmente, ao final da década de 90, veio o sucesso da Apache Software Foundation, com suas leis e princípios conhecidos por "Foundation Bylaws", criados para fomentar a meritocracia em projetos Open-Source colaborativos.

Apesar de ter tido pouca tração comercial, esta fase fundamental permitiu que mais empresas adotassem projetos de software devido à diminuição do "custo de entrada" na tecnologia (com a eliminação dos licenciamentos iniciais), e ainda promoveu dimimuição de custos em softwares proprietários concorrentes, inclusive tornando "commodities" algumas categorias de produtos, tais como o Web-Server (Apache) e SO Unix (Linux).

Porém, a necessidade da formação e da internalização de especialistas em todas as tecnologias Open-Source tornaria este movimento limitado e com poucas chances de penetrações no atual mundo dos negócios, caso não surgissem opções comerciais de serviços especializados, na fase 1.5, descrita abaixo.

No Brasil, muitas empresas cujo foco não é TI ainda estão às voltas com trabalhos de integração e especialização de Open-Source, em uma distorção típica desta fase (chamada de "romântica", ou do "não posso comprar").

Open-Source 1.5 (Software Gratuito e Aberto; Serviços Comerciais)

Esta fase inicia a profissionalização e catapulta a importância do Open-Source para a indústria em geral. Os serviços de manutenção, suporte e customização de "matéria prima" Open-Source são oferecidos comercialmente, mas o software permanece gratuito. A diferenciação não vem do software em si, mas dos serviços em torno do mesmo. Empresas como JBoss Group e Redhat se inserem neste modelo.

Como o reuso de Open-Source se dá, especialmente em J2EE, sobre "componentes" (matéria-prima), e não sobre "aplicações prontas" (produtos), esta fase não corrigiu o problema do alto custo de propriedade, por meio de pessoal interno fazendo montagem, integração, especialização e acabamento final, como na primeira fase.

Ainda nesta fase começou um esboço de modalidades de licenciamento de produtos Open-Source que o Delphi Group chama de "Insfrastructure Stack" para o OSS. Ou seja, uma plataforma integrada e organizada que diminui a "interface" do cliente com a miríade de componentes Open-Source, permitindo sua assimilação de forma mais rápida e gerenciável pelas empresas (baixo acoplamento também é uma boa prática nos negócios, não somente na nossa programação).

Ao final desta fase (iniciada por volta de 2001), na primeira geração de produtos comerciais Open-Source, um dos primeiros produtos de "Open-Source Stack" foi o Internet Application Plataform (IAP), com base tecnológica Open-Source ainda "não Java", conhecida como LAMP: Linux, Apache, MySQL, PostGreSQL, PHP e Pearl. Este produto oferecia a base de funcionalidades contida em produtos comerciais tais como SunOne, IBM WebSphere, BEA Weblogic ou Oracle iAS, que também usam insumos Open-Source, porém não repassam estas vantagens de licenciamento para seus clientes.

Mas o IAP não era robusto (não era J2EE!) para atendimento às necessidades dinâmicas do eBusiness atual, e seria preciso se "subir o nível de abstração" do Stack, incluindo suítes mais completas.

Com produtos incompletos, a permanência de um considerável "Custo Total de Propriedade" persistiu na fase 1.5, apesar da diminuição do "Custo de Entrada", ou "Custo Inicial do Licenciamento", como evidenciado pela pesquisa do Delphi Group: 57% das empresas apontaram "Baixar o Custo Total de Propriedade" como primeiro objetivo com sua estratégia Open-Source, enquanto 17% apontaram "Evitar Ficar Preso ao Fornecedor" e somente 7% apontaram "Baixar o Custo de Aquisição"!

No Brasil, temos visitado um grande número de empresas com problemas sérios desta monta. Após "ganharem" produtos Open-Source de fornecedores interessados em serviços (frequentemente, softwares parciais incompletos, não concebidos como produtos), e de se depararem com os problemas, os Clientes simplesmente não possuem meios legais de obter "comprometimento" do fornecedor em manter a manutenção, acertos ou evolução nos níveis de qualidade desejados. A história acaba com o Cliente assumindo um grande problema fora de seu "core-business" , mantendo grupos internos em prospecção, especialização, complementação de documentação, integração, suporte e homologação destes produtos (fase do chamado "Cavalo de Tróia").

Open-Source 2.0 (Software Aberto; Qualidade Comercial)

Segundo o Delphi Group: e conforme já temos constatado na prática em nossas visitas a diversos clientes pelo país, para que softwares Open-Source sejam adotados pela maioria dos consumidores de softwares comerciais, e finalmente entrem na "missão crítica" das empresas, rivalizando com os grandes fornecedores, é necessário que demonstrem um padrão de qualidade compatível com estes últimos e ofereçam algumas vantagens intrínsecas em um modelo de "comercialização" (sim, comprar também tem suas vantagens!), tais como repasse de riscos e compromisso "contratual e legal" por parte de fornecedores com relação à qualidade do que oferecem.

Na pesquisa do Delphi Group, 70% das empresas citaram a necessidade de soluções Open-Source "embaladas comercialmente", com qualidade compatível com seus concorrentes comerciais, como fator decisivo para sua opção por esta nova modalidade! Considerando isso e mais a relação de 10 para 1 entre "Baixar o Custo de Propriedade" x "Baixar o Licenciamento Inicial", o Delphi Group concluiu que o futuro do Open-Source está em um balanço de licenciamento que, através de uma "fina camada comercial" (fração do preço dos produtos fechados), ofereça o melhor dos dois mundos ao Cliente, o modelo chamado "Managed Open-Source" (Open-Source Gerenciado).

Modelo de Licenciamento "Open-Source Gerenciado" (Managed Open-Source)

Open-Source não é sinônimo do software gratuito! Pode ser sinônimo de software free (de freedom), mas não necessariamente de software free (cash). Liberdade é fundamental, mas nem sempre a "gratuidade" traz consigo a liberdade desejada, como já vimos na fase do "Cavalo de Tróia".

Infelizmente, nosso encontro do Just Java (de 2005) não contribuiu muito para amadurecermos esta questão, pela constatação que fizemos das visitas que recebemos. Os visitantes não compreendiam como poderiam sobreviver no mundo de negócios atual somente com produtos colaborativos, sem datas e equipes definidas, com dependência de uma comunidade que, se não quiser (ou não puder) colaborar, colocará em derrocada seus projetos.

Extraindo do artigo: "For many 'open-source' is understood to be synonimous with 'free'. As a result it is often erroneously assumed that Open-Source Software cannot be sold" (...) While Open-Source may have been born of the free sofware movement, the defining characteristic for open source licensing is not the inability to charge a fee for software, but access to source code."

O modelo "Managed Open-Source" é o modelo que temos praticado, já há mais de 3 anos, e com ele substituímos iniciativas de grandes fornecedores (e evitamos uma boa remessa de divisas para fora do pais) em dezenas de casos em grandes empresas brasileiras, públicas e privadas.

Nenhum Cliente, até hoje, reclamou da coerência ou questionou os benefícios desta modalidade de licença, de bastante senso ao entregar o melhor dos dois mundos: liberdade e independência de fornecedor, com qualidade, responsabilidade e comprometimentos comerciais. Ainda, um "Baixo Custo Total de Propriedade", mesmo quando comparado a alternativas Open-Source gratuitas!

Os obstáculos que temos derrubado são culturais, advindos de política do Open-Source ainda em "fase romântica" no Brasil. Ouvimos no encontro (até nos dias de hoje!) que não é "ético" vender software, em uma das coisas mais estúpidas que se pode dizer! Fornecedores de serviço cedendo "Cavalos de Tróia" para os Clientes, na verdade causam "deserviço" às nossas empresas e ao movimento Open-Source.

O modelo de licenciamento "Open-Source Gerenciado" (que a Powerlogic tem usado na prática, com sucesso) compõe-se das seguintes linhas mestras pelo Delphi Group:

Responsabilidade do fornecedor pela pré-integração de componentes OSS "matéria prima", de diversos projetos como ASF ou SourceForge, incluindo homologação, testes e verificação automática de integração (check-sum verificável do ambiente, através de rotinas Ant).

Entrega de versões homologadas e releases intermediários em CD de instalação, oferecendo o ambiente "pronto para uso" (out-of-box), imediatamente funcional para que o Cliente codifique, imediatamente, seus objetivos de negócio.

Especialização com alto valor agregado, incluindo grande quantidade de código Java, JSP, XML, CSS, Javacript, recursos, de "última milha", que não se encontram contempladas em nenhum dos componentes integrados (Completeza funcional que rivaliza com produtos comerciais).

Metodologia completa para construção J2EE, com documentação extensiva e roteiros integrados ao ambiente da IDE, inclusive com checklist, passo a passo, para a construção de aplicações que integram dezenas de componentes Open-Source ao longo do processo.

Liberação de acesso a todos os códigos fontes e inclusive documentos da metodologia, com direitos a atualização e mesmo que o Cliente repasse estes fontes para terceiros não licenciados, quando incluidos em soluções desenvolvidas por ele. A parte que recebe a cessão - e não possui licenciamento - somente não pode utilizar o produto para novos desenvolvimentos, sem licenciá-los.

Fórum e Suporte com qualidades comerciais, inclusive com opção 24x7.

Testes e homologação de soluções específicas dos clientes, com possível incorporação futura e manutenção da compatibilidade.

Conclusão

Todos "amamos" o movimento Open-Source, e seus benefícios para nosso país estão apenas no começo. Mas eu quero crer que o discurso "romântico" (melhor guardá-lo para nossas esposas e namoradas) está na hora de acabar. Creio que, mesmo o desenvolvedor iniciante para o qual um discurso simplista poderia parecer mais sedutor, se estiver inserido em uma empresa, irá compreender os princípios acima discorridos.

Para os clientes ainda temerosos em sairem dos grandes fornecedores "caixa-preta", tenho uma mensagem:

Todas as gerações do Open-Source supra-citadas irão coexistir. Em uma visão de médio prazo e do ponto de vista de seu negócio, diminuam a sua "interface" com a miríade de projetos OSS através de um parceiro responsável, seja ele qual for. Adquiram soluções Open-Source Gerenciadas, sempre que elas existirem e oferecerem custo compatível, diminuindo o "Custo Total de Propriedade" ainda mais, e mantendo um compromisso formal e legal com um parceiro, repassando para o mesmo, questões fora de seu "core business". Exija os fontes, pois com eles vem a independência, liberdade de escolha e poder de barganha. Este modelo é imbatível e reúne os elementos que justificarão a saída das adjacências e a entrada do Open-Source nas aplicações de missão crítica de sua empresa. Ah! E contribuam, sempre que possível, para iniciativas colaborativas, como um "terceiro setor", ou mesmo em projetos no fim da lista das prioridades.

Para aqueles desenvolvedores possivelmente desanimados, pensando em como ganhariam a vida sem "vender software" (montar uma logística de serviços não é tarefa simples), uma outra mensagem:

Estudem, conheçam como ninguém, integrem e especializem "insumos" Open-Source para as necessidades das empresas brasileiras. Colaborem e criem softwares colaborativos sempre que julgarem adequado. Ofereçam seus produtos com acabamento e completeza, e sob uma licença "Managed Open-Source". Você conseguirá competir mesmo com os grandes, e entregará o melhor para seus Clientes.

Aqueles que têm acesso aos articuladores da política de software livre no Brasil, e acreditem neste manifesto, repassem-no adiante. Este momento é realmente de oportunidade para a indústria de software nacional, mas precisamos compreender o movimento OSS com maturidade, antes da Índia, China ou de qualquer outro concorrente, se desejamos chegar lá.

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